Rubens Amador
O dia em que o Graf Zeppelin sobrevoou Pelotas
Rubens Amador
Jornalista
Todas as cidades, como os seres humanos, passam por momentos significativos. Uns agradáveis, outros tristes. Pelotas viveu, no passado, dias tristes. Lembro-me das grandes enchentes de 1941 e 1956, mas o destino reservou também um momento mágico. Foi o dia 29 de junho de 1934, às 16h40min, quando surgiu, majestoso, o dirigível Zeppelin, a 600 metros de altura, para que Pelotas tivesse também outro momento inesquecível! Naquele dia deu-se um sobrevoo que ficará para sempre em nossa história citadina: o do famoso Graf Zeppelin, criação do conde germânico que levava esse nome.
Eu tinha sete anos de idade, mas lembro-me muito bem de onde ele surgiu, lá para o lado nordeste. Morador das imediações, eu estava na Praça Coronel Pedro Osório brincando quando, de repente, vi grupos de pessoas olhando para o céu. Em seguida, olhei para cima e vi, aproximando-se da praça, aquele enorme aparelho, silencioso, que na época eu nem sabia o que era e que, por certo, já tinha sido anunciado na imprensa seu sobrevôo sobre Pelotas. Era algo enorme, com 236 metros de comprimento, ligeiramente menor que o Titanic. Levava 20 passageiros e 40 tripulantes. Nesta altura já via o aerostato sobre minha cabeça e podia perceber claramente a enorme gôndola os passageiros e tripulantes se acomodavam, acenando-nos de várias janelas. Viam-se lenços brancos lá do alto.
O Zeppelin circundou a praça e, por certo, deve ter ido até a Sociedade Germânia, lá para os lados do Fragata, entidade social então de muita influência social na cidade e que, a seu pedido, bem como da comunidade alemã local, o dirigível fez aquele sobrevoo para nós inesquecível.
O brilho de sua superfície prateada (duralumínio) era intenso, dado o forte sol daquela tarde. Foi um espetáculo inesquecível, só posso repetir. Meus contemporâneos deverão ter vívida em suas mentes, ainda hoje, aquela visita famosa, pois então acreditava-se que ali estava o transporte do futuro. Pensava-se que poderia transportar de 500 a 600 pessoas em vôo sereno, capaz de ir a qualquer parte do mundo e, sobretudo, acreditava-se: altamente seguro. Essas eram, basicamente, as razões do acontecimento ter assumido tais proporções, marcando definitivamente – pensava-se – a própria história do mais pesado que o ar.
Mas logo após, veio a decepção, pois um similar do Zeppelin, o Graf Hindenburg, de maiores proporções, ao descer na cidade americana de Lakehurst, New Jersey, incendiou-se quando o amarravam ao solo, matando muitas pessoas. Ainda não se conhecia um gás não inflamável como o que fazia pairar o artefato, abastecido apenas com hidrogênio, material altamente inflamável. Ali ficou sepultada a ideia dos voos transatlânticos naquele tipo de nave.
Apesar da tragédia que nos privou dos dirigíveis, o sobrevoo do Zeppelin sobre Pelotas jamais foi esquecido. A imprensa da época colheu depoimentos inusitados. Um popular entrevistado na ocasião, lá no famoso Café Caneca, no cais do porto, disse o seguinte: "O tal de Zé Pelin me deu um susto danado. Pensei que era uma bomba da grande guerra ainda voando". Houve outras descrições interessantes, como esta: "Minha mulher dizia que era um grande charuto, reclame de alguma marca nova". E um punguista uruguaio, ali na Praça Coronel Pedro Osório, enquanto as pessoas olhavam maravilhadas para o Zeppelin, bateu várias carteiras. Soube-se que acabou preso.
No dia imediato ao sobrevoo impressionante, o Diário Popular publicou, com certa poesia: "A alma pelotense viveu, ontem, instantes de infinita satisfação e se deixou maravilhar ante a passagem serena, deslumbrante, majestosa, da grande aeronave alemã, o 'Graf Zeppelin', que, pela primeira vez (e seria a última), atendendo o seu ilustre comandante, o conspícuo engenheiro Sr. Eckner, aos reiterados reclamos das associações e personalidades de destaque da colônia germânica entre nós, cruzou o céu de Pelotas". Na cauda do Zeppelin havia duas suásticas, pois eram tempos de nazismo.
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